Notícias

Saneamento básico é questão de saúde e desenvolvimento sustentável Basic sanitation is a matter of health and sustainable

13/07/2012

Saneamento

O saneamento é socialmente seletivo: a falta de condições ambientais sãs, para uma grande fração da população brasileira, coincide com sua marginalização social, educacional, econômica, ecológica

Os Indicadores de Desenvolvimento Sustentável (IDS 2012) divulgados pelo IBGE, durante a Rio + 20 – Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, que ocorreu de 16 a 22 de junho na capital fluminense, traçam o panorama brasileiro, em quatro dimensões: ambiental, social, econômica e institucional. Os 62 indicadores mostram ganhos e fragilidades.

Entre os ganhos, incluem-se a redução, em seis anos, de cerca de 77% no desflorestamento bruto anual da Amazônia Legal; o aumento do número de áreas protegidas; a queda da mortalidade infantil, pela metade, em uma década; e o acesso crescente às redes de água e esgoto e aos serviços de coleta de lixo. Entre as fragilidades, temos as desigualdades socioeconômicas e de gênero.

Perto da metade dos indicadores aponta resultados favoráveis, parte deles com algum tipo de ressalva. No material, um dos maiores desafios destacados é o do saneamento, cujos valores de coleta, destinação ou tratamento adequado de água, esgoto e lixo, em parte ainda baixos, interagindo com outros indicadores, apontam para consequências como persistência do elevado número de internações por doenças ligadas à falta de saneamento básico – mais comuns no Norte e Nordeste.

O saneamento urbano faz parte de uma grande série de processos dessa fisiologia de nossas ecologias urbanas, diz o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), Frederico Flósculo Pinheiro Barreto. Ele explica que, em especial, o saneamento envolve a destinação de dejetos – inclusive sua reciclagem, tornando-os parte de nossos sistemas produtivos de alimentos, de habitat. “Hoje pensamos o saneamento em mão-única, na mesma direção em que os nossos próprios dejetos desaparecem nos nossos vasos sanitários ao acionarmos a descarga. Esse é um momento sublime de nossa relação pessoal com a cidade, seus serviços, seu saneamento e todo o ambiente natural que nos suporta: nem pensamos mais nisso, descarga dada”, salienta. Entretanto, quando questionado se deveríamos refletir sobre o assunto, o professor responde prontamente: “Com certeza. Somente assim criamos as condições políticas para que o saneamento seja realmente são, e envolva toda a cadeia de destinação, reciclagem e realimentação de nossa economia de forma efetivamente sustentável, acredita.

Ele ressalta que o saneamento, contudo, é socialmente seletivo: a falta de condições ambientais sãs, para uma grande fração da população brasileira, coincide com sua marginalização social, educacional, econômica, ecológica. “Para superar esse quadro precisamos de políticas públicas com fundamentos científicos verdadeiros”, argumenta ao refletir que para isso é necessário que se leve em conta o planejamento urbano.

“Como em todas as áreas que fundamentam as políticas públicas de desenvolvimento humano e urbano, o planejamento das cidades depende crucialmente das teorias científicas e das inevitáveis conjunturas políticas que cercam esses interesses, essas transformações sociais e ambientais”, assegura o professor de Arquitetura e Urbanismo da UnB. Em sua ótica, hoje, o planejamento urbano brasileiro é medíocre, mas tão medíocre quanto à média internacional. Não incorporamos ainda uma enorme variedade de paradigmas, especialmente os que dizem respeito à interação sociedade-ambiente urbano e regional. “Para se elaborar planos urbanos, na atualidade, na segunda década do século 21, devemos partir dessa grande avaliação, da grande contabilidade de ganhos e perdas no uso de recursos naturais e humanos”, fala Frederico ao lamentar que, a esmagadora maioria dos planos urbanos brasileiros da atualidade, sem nenhuma exceção relevante, infelizmente, é essencialmente imobiliária: são planos que orquestram destinações de uso do solo para atender a demandas da construção civil e das diversas modalidades de comercialização e exploração dos imóveis urbanos, essencialmente. “O desenvolvimento humano, a saúde, o bem estar e a qualidade de vida comunitária são praticamente ignorados no atual e deplorável estágio”, reconhece.

De acordo com o especialista é preciso também levar em conta a saúde da população, no momento em que planeja construir. Ele aponta que antes de tudo é preciso considerar os fatos básicos da ecologia humana, em várias escalas. A mais ampla é a escala intergeracional, que considera a convivência de várias gerações no mesmo espaço físico, social, econômico, antrópico. “Nossas cidades, especialmente as grandes cidades, são intergeracionalmente falidas: não são boas para as crianças e adolescentes, nem são boas para os idosos. São cidades, como diria Nietzsche, apolíneas feitas para adultos que vivem vidas produtivas em um sistema econômico extremamente cioso de sua eficiência”, constata. Para ele, a partir daí, começamos a somar distorções gravíssimas, que tornam as sociedades e as cidades insalubres, inóspitas. “Precisamos redesenhar as nossas cidades e nossas instituições, mas pragmaticamente, podemos começar com a (re)valorização dos espaços públicos das cidades”, sugere. Ele defende grandes jardins, parques urbanos, arborização intensiva, associados ao fortalecimento do que chama de sistemas de qualidade de vida – habitação, saúde, educação, segurança, lazer, trabalho, mobilidade. Medidas que, para o professor, estão ao nosso alcance agora. “Não há mais como hesitar e adiar o redesenho desses primeiros componentes das cidades saudáveis”, completa.

Planejamento urbano X estruturação urbana
Há uma crucial diferença entre planejamento urbano e o processo real de estruturação urbana. Nossas cidades, como a maior parte das cidades do mundo, inclusive nas nações industrializadas, são precariamente planejadas. “O planejamento urbano é retardatário, desvalorizado como função crítica, inteligente, de governo, e tem se tornado instrumento dos interesses econômicos e políticos que desfiguram as cidades. São esses interesses que devem ser questionados. É com esses interesses que cidadãos e cientistas devem negociar, pois não parece haver freio ou mediação ao seu impacto”, alerta o professor de Arquitetura e Urbanismo da UnB. Frederico garante que a falta de racionalidade no processo de estruturação urbana – a falta de planejamento urbano – tem impacto crescente no clima, na saúde da população, na criação de imenso sofrimento e frustração. “Como podemos viver em sociedades tão ricas, tão capazes de gerar recursos econômicos, mas que não são empregados em objetivos realmente ambiciosos de desenvolvimento humano”, questiona.

Construção deve seguir regras
As edificações devem possuir afastamentos para que todos os espaços recebam sol e tenham acesso ao ar do planeta. Esse tipo de preocupação está bem estabelecida há pelo menos dois séculos, desde o movimento higienista britânico, crítico – em tempo real – das péssimas condições de habitação e expansão urbana induzidas pela revolução industrial inglesa. Também são os ingleses que introduzem a poderosa ideia de cidades-jardim. “Esse é o modelo das cidades do futuro, que devem ser reestruturadas para se tornarem cidades verdes, amplamente arborizadas, capazes de produzir tanto alimento quanto o campo. Todavia, isso também é perfeitamente possível agora. Depende da vontade política”, defende o especialista.

Rio + 20
Para Frederico a Rio + 20, traz contribuição neste setor. “O debate global sobre a questão ambiental é obrigatório, inescapável. A grande questão do debate sobre o futuro da humanidade – um futuro feliz, saudável, gratificante – é mesmo a ampliação da consciência de nossa responsabilidade individual sobre nossos governos, a ampliação de nosso poder de protagonismo cidadão”, destaca. Em sua opinião, os governos não pensam, quem pensa somos nós cidadãos, e não devemos deixar os nossos governos sós, nem por um minuto. O custo do futuro é o debate permanente, incansável. “Exige cada vez mais inteligência, dedicação, ser civilizado e ter um alto padrão de qualidade de vida: será uma luta eterna contra a incansável entropia de nossas próprias sociedades”, analisa.

Saneamento

Sanitation is socially selective: the lack of sound environmental conditions, for a large fraction of the population coincides with social, educational, economic and ecological marginalization.
Sanitation is socially selective: the lack of sound environmental conditions, for a large fraction of the population coincides with social, educational, economic and ecological marginalization.
Sanitation is socially selective: the lack of sound environmental conditions, for a large fraction of the population coincides with social, educational, economic and ecological marginalization.

The Sustainable Development Indicators (IDS 2012) released by the IBGE, during the Rio + 20 – United Nations Conference on Sustainable Development, June 16-22, in the state capital, outline Brazil’s landscape in four dimensions: environmental, social, economic and institutional. The 62 indicators show gains and weaknesses.

Among the gains are the reduction, during the past six years, of about 77% of annual gross deforestation in the Amazon, the increase in the number of protected areas, the 50% decline in infant mortality in a decade, and the growing access to water, sewerage and garbage collection services. Weaknesses include socioeconomic and gender inequalities.

About half of the indicators show positive results, some of them with caveats. Regarding the material, one of the biggest challenges is sanitation. The rates ??of collection, disposal or appropriate treatment of water, sewerage and garbage, in part still low, when combined with other indicators, point to consequences such as a high number of hospitalizations due to sanitation-related diseases – more common in North and Northeast Brazil.

Urban sanitation is part of the large number of processes of this physiology of our urban ecologies, says Frederico Flósculo Pinheiro Barreto, professor of the Faculty of Architecture and Urbanism at the University of Brasilia (UNB). As he explains, sanitation involves the destination of waste disposal – including its recycling, making it part of our food production systems and habitat. Nowadays, sanitation is considered a one-way road, in the same direction that our own waste disappears in our toilets after we flush them. This is a sublime moment of our personal relationship with the city, its services, its sanitation, and the whole natural environment that supports us: we do not even think about it after we push the flush, he stresses. However, when asked whether we should reflect on the subject, the professor promptly responds: Absolutely! Only then do we create the right political conditions for our sanitation to be really sound, involving the entire chain of disposal, recycling and feedback of our economy in a truly sustainable manner, he believes.

He points out that sanitation, however, is socially selective: the lack of sound environmental conditions, for a large fraction of the Brazilian population, coincides with social, educational, economic and ecological marginalization. To overcome this scenario we need public policies with real scientific basis, he argues when reflecting that it is vital to take urban planning into account.

As in all areas that support public policies of human and urban development, the planning of cities depends crucially on scientific theories and on the inevitable political circumstances surrounding these interests, these social and environmental changes, says the professor. In his view, Brazilian urban planning is currently mediocre, but as mediocre as the international average. We have not yet incorporated an enormous variety of paradigms, especially those concerning the interaction between society and urban/regional environment. Nowadays,  in the second decade of the 21st century, to develop urban plans, we must start by assessing the gains and losses that have occurred from the use of natural and human resources, says Frederico, who regrets that the vast majority of plans in urban Brazil these days, without exception, are driven by real-estate: they are essentially plans that allocate land use to meet the demands of construction companies and the various methods of marketing and exploitation of urban real estate. Human development, health, welfare and quality of community life are virtually ignored in this current and deplorable stage, he acknowledges.

According to the expert, the health of the population must also be taken into account when one plans to build. He points out that firstly the basic facts of human ecology at various scales must be considered. The broadest one is the inter-generational scale, which considers the coexistence of several generations in the same physical, social, economic, man-made space. Our cities, especially the large ones, have failed in the inter-generational aspect: they are neither child and adolescent friendly, nor elderly friendly. They are what Nietzsche would call Apollonian cities, i.e., made for adults who live productive lives in an economic system that is extremely aware of its efficiency. In his opinion, this is where serious distortions start to occur, which make societies and cities unhealthy, inhospitable. We need to redesign our cities and our institutions, but pragmatically; we can begin with the (re)development of public spaces of cities, he suggests. He advocates large gardens, urban parks, and intensive forestation, associated with strengthening of the so-called quality of life systems – housing, health, education, security, leisure, work and mobility. Measures which, he believes, are currently within our reach. There should be no more hesitation or delay in redesigning the primary components of healthy cities, he adds.

Urban planning X urban structuring
There is one crucial difference between urban planning and the actual process of urban restructuring. Our cities, like the majority of the cities in the world, including those in industrialized nations, are poorly planned. Urban planning is a laggard, undervalued as a critical and smart government function, and has become an instrument of economic and political interests that disfigure the cities. These are the interests that should be questioned. It is with these interests that citizens and scientists must negotiate because there seems to be no brake or mediation to their impact, says the Professor.  Frederico ensures that the lack of rationality in the process of urban structuring – the lack of urban planning – has a growing impact on climate, population health, the creation of immense suffering and frustration. How can we live in societies that so rich, so capable of generating economic resources, but which do not employ ambitious goals of human development, he questions.

Construction must follow rules
The buildings must have clearances so that all areas get sunlight and have access to air. Such concern has been well established for at least two centuries, since the British hygienic movement, which criticized, in real time, the terrible conditions of housing and urban expansion induced by the British industrial revolution. The British also introduced the powerful idea of ??garden cities. This is the model for cities of the future that must be restructured to become green cities, planted with plenty of trees, capable of producing as much food as the countryside. However, it is perfectly viable nowadays; it depends on political willpower, according to the expert.

Rio+20

Frederico believes that the Rio + 20 meeting contributed to this sector. The global debate on the environmental issue is mandatory, inescapable. The big issue of the debate on the future of mankind – a happy, healthy, rewarding future – is the increase of awareness of our individual responsibility over our governments, the widening of our power as citizens, he says. In his view, governments do not think, those who think are us, the citizens, and we must not leave our governments alone, even for a minute. The cost of the future is the ongoing, indefatigable debate. It requires more and more intelligence, dedication, being civilized and having a high standard of quality of life: it will be an eternal struggle against the relentless entropy of our societies, ponders Frederico.