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Aluísio Rosa Prata 01/06/1920 – 13/05/2011Aluísio Rosa Prata 01/06/1920 – 13/05/2011

18/05/2011

A Sociedade Brasileira de Medicina Tropical está profundamente abalada pela morte de um dos seus fundadores, o Professor Aluísio Rosa Prata na última sexta-feira, às 15:30 horas do dia 13 de maio de 2011, aos 90 anos.?

O Professor Prata era líder natural, inconteste. A suavidade de suas palavras não escondia a firmeza e a clareza de seu pensamento, o que as tornava sempre preciosas. De visão prática, dedicava-se às doenças tropicais com um idealismo que o aproximava de um visionário ou de um asceta. O brasileiro sertanejo, abandonado pelo estado, perdido em uma estrutura produtiva que o afasta do resto da nação e que o aproxima das doenças endêmicas era o motivo de seu trabalho incansável. O Brasil era a sua paixão, o Brasil mulato, caboclo, caipira e, em particular, o Sertão que ele tanto conheceu por seus olhos e pelos olhos de Euclides da Cunha. A Ciência era a obsessão que o domava, que o impulsionava rumo a destinos desconhecidos e sempre almejados, com a consciência plena do pode rque ela tem para superar a maldição da pobreza rural. Foi esta visão que o levou a criar a SBMT juntamente com outros grandes homens, ainda sócios ativos, como Anis Rassi, Joffre Marcondes de Rezende, José Rodrigues Coura, Léa Camilo Coura, Vicente Amato Neto, Zilton Andrade, Fernando Mota de Azevedo Correia e tantos incorrigíveis sonhadores que já se foram.?

Com capacidade de trabalho extraordinária, com visão clara das lacunas doconhecimento e objetividade formidável ao propor os estudos certos para preenchê-las, o Professor Prata era apaixonado pela elucidação da história natural das doenças que abordava em diversos estudos de coorte que até o presente oferecem respostas a questões fundamentais: esquistossomose em Caatinga do Moura (BA), Água Quente (BA), Brejo do Espírito Santo (BA), doença de Chagas em São Felipe (BA), Mambaí (GO), Água Comprida (MG), Santa Maria da Vitória (BA), leishmaniose tegumentar em Corte de Pedra (BA), Três Braços (BA), Varzelândia (MG) malária em Forte da Beira (RO), Costa Marques (RO) e, mais recentemente, calazar em Porteirinha (MG) e Paracatu (MG).?

Ainda aluno do quarto ano de medicina e sonhando em ser um cientista, em uma longa viagem para Inhaúmas, no oeste da Bahia, para investigar a história natural da esquistossomose, ele me contava as histórias da vida e da ciência. Disse-me que a ciência se faz através de uma competição honrada entre indivíduos excepcionais, mas que não deixava de ser uma competição, eventualmente maculada. Somente muito mais tarde vim a perceber que este lado não romântico realmente existia. De fato, o Professor Prata não transparecia romantismo, mas, no final das contas a sua própria vida foi o maior exemplo de desafiar as convenções, de sonhar o impossível, de mostrar a estupidez da miséria burguesa e de dedicar-se à causa dos desprivilegiados como poucos o fizeram.?

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Começou a sua vida em Corumbá, no Mato Grosso do Sul, até que a realidade da prática médica, da distância de centros urbanos e, principalmente, o seu eterno amor pela sua linda e dedicada Marta (quanto amor, poucos vi iguais!) o alertasse que tinha que singrar novos mares. Assim, na Marinha foi para Salvador, onde se aliou, na excepcional escola baiana de medicina tropical, a homens e mulheres do vulto de Heonir Rocha, Zilton e Sônia Andrade, Rodolfo Teixeira e Armênio Guimarães. Lá, na loucura persecutória da ditadura militar, deu guarita aos perseguidos, como Samuel Pessoa, pois, (embora poucos saibam) nutria uma antipatia visceral pelos políticos, particularmente se comparados com o brilho e o idealismo dos cientistas. Lá, juntou-se à inteligência e à ousadia de Vanize Macêdo, de Phillip Marsden e de Air Colombo Barreto e os trouxe para a segunda revolução do curso de Medicina da Universidade de Brasília, onde a Medicina Tropical passou a reinar. Finalmente, voltou à sua amada Uberaba para continuar sonhando e trabalhando e nos deixar como legado a Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical muito bem estruturada, a Reunião Pesquisa Aplicada de Uberaba, de doença de Chagas e de leishmanioses definitivamente estabelecidas e uma legião de discípulos.?

Deixou muitos destes discípulos, em muitos lugares. Deixou alunos de graduação, muitos que o amavam, mas jamais revidou aos que o rejeitavam, pois sabia da importância de jovens altivos para estabelecer novos paradigmas para a ciência. Na verdade, acho que realmente amava aos que o desafiavam. Nos cursos de especialização, no mestrado e doutorado em Medicina Tropical formou cientistas e médicos que retornaram aos rincões do Brasil, América Latina e África a fora para fundarem novos núcleos de medicina tropical. Com eles estabeleceu novos centros em Manaus, em São Luís, em Teresina, no Espírito Santo, na própria Uberaba e em muitos e muitos outros locais. E com cada um deles, vai o nome e a personalidadedo Professor Aluísio Rosa Prata, espalhando mundo a fora as sementes da concreta ciência, da romântica Medicina Tropical, do trabalho duro, da honestidade essencial, e das exigências da liberdade do espírito e dos livres espíritos para se sonhar e trilhar por esta dobra do mundo.?


Carlos Henrique Nery Costa
Presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical

Teresina, 16 de Maio de 2011? 

A Sociedade Brasileira de Medicina Tropical está profundamente abalada pela morte de um dos seus fundadores, o Professor Aluísio Rosa Prata na última sexta-feira, às 15:30 horas do dia 13 de maio de 2011, aos 90 anos.?

O Professor Prata era líder natural, inconteste. A suavidade de suas palavras não escondia a firmeza e a clareza de seu pensamento, o que as tornava sempre preciosas. De visão prática, dedicava-se às doenças tropicais com um idealismo que o aproximava de um visionário ou de um asceta. O brasileiro sertanejo, abandonado pelo estado, perdido em uma estrutura produtiva que o afasta do resto da nação e que o aproxima das doenças endêmicas era o motivo de seu trabalho incansável. O Brasil era a sua paixão, o Brasil mulato, caboclo, caipira e, em particular, o Sertão que ele tanto conheceu por seus olhos e pelos olhos de Euclides da Cunha. A Ciência era a obsessão que o domava, que o impulsionava rumo a destinos desconhecidos e sempre almejados, com a consciência plena do pode rque ela tem para superar a maldição da pobreza rural. Foi esta visão que o levou a criar a SBMT juntamente com outros grandes homens, ainda sócios ativos, como Anis Rassi, Joffre Marcondes de Rezende, José Rodrigues Coura, Léa Camilo Coura, Vicente Amato Neto, Zilton Andrade, Fernando Mota de Azevedo Correia e tantos incorrigíveis sonhadores que já se foram.? 

Com capacidade de trabalho extraordinária, com visão clara das lacunas doconhecimento e objetividade formidável ao propor os estudos certos para preenchê-las, o Professor Prata era apaixonado pela elucidação da história natural das doenças que abordava em diversos estudos de coorte que até o presente oferecem respostas a questões fundamentais: esquistossomose em Caatinga do Moura (BA), Água Quente (BA), Brejo do Espírito Santo (BA), doença de Chagas em São Felipe (BA), Mambaí (GO), Água Comprida (MG), Santa Maria da Vitória (BA), leishmaniose tegumentar em Corte de Pedra (BA), Três Braços (BA), Varzelândia (MG) malária em Forte da Beira (RO), Costa Marques (RO) e, mais recentemente, calazar em Porteirinha (MG) e Paracatu (MG).? 

Ainda aluno do quarto ano de medicina e sonhando em ser um cientista, em uma longa viagem para Inhaúmas, no oeste da Bahia, para investigar a história natural da esquistossomose, ele me contava as histórias da vida e da ciência. Disse-me que a ciência se faz através de uma competição honrada entre indivíduos excepcionais, mas que não deixava de ser uma competição, eventualmente maculada. Somente muito mais tarde vim a perceber que este lado não romântico realmente existia. De fato, o Professor Prata não transparecia romantismo, mas, no final das contas a sua própria vida foi o maior exemplo de desafiar as convenções, de sonhar o impossível, de mostrar a estupidez da miséria burguesa e de dedicar-se à causa dos desprivilegiados como poucos o fizeram.? 

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Começou a sua vida em Corumbá, no Mato Grosso do Sul, até que a realidade da prática médica, da distância de centros urbanos e, principalmente, o seu eterno amor pela sua linda e dedicada Marta (quanto amor, poucos vi iguais!) o alertasse que tinha que singrar novos mares. Assim, na Marinha foi para Salvador, onde se aliou, na excepcional escola baiana de medicina tropical, a homens e mulheres do vulto de Heonir Rocha, Zilton e Sônia Andrade, Rodolfo Teixeira e Armênio Guimarães. Lá, na loucura persecutória da ditadura militar, deu guarita aos perseguidos, como Samuel Pessoa, pois, (embora poucos saibam) nutria uma antipatia visceral pelos políticos, particularmente se comparados com o brilho e o idealismo dos cientistas. Lá, juntou-se à inteligência e à ousadia de Vanize Macêdo, de Phillip Marsden e de Air Colombo Barreto e os trouxe para a segunda revolução do curso de Medicina da Universidade de Brasília, onde a Medicina Tropical passou a reinar. Finalmente, voltou à sua amada Uberaba para continuar sonhando e trabalhando e nos deixar como legado a Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical muito bem estruturada, a Reunião Pesquisa Aplicada de Uberaba, de doença de Chagas e de leishmanioses definitivamente estabelecidas e uma legião de discípulos.?

Deixou muitos destes discípulos, em muitos lugares. Deixou alunos de graduação, muitos que o amavam, mas jamais revidou aos que o rejeitavam, pois sabia da importância de jovens altivos para estabelecer novos paradigmas para a ciência. Na verdade, acho que realmente amava aos que o desafiavam. Nos cursos de especialização, no mestrado e doutorado em Medicina Tropical formou cientistas e médicos que retornaram aos rincões do Brasil, América Latina e África a fora para fundarem novos núcleos de medicina tropical. Com eles estabeleceu novos centros em Manaus, em São Luís, em Teresina, no Espírito Santo, na própria Uberaba e em muitos e muitos outros locais. E com cada um deles, vai o nome e a personalidadedo Professor Aluísio Rosa Prata, espalhando mundo a fora as sementes da concreta ciência, da romântica Medicina Tropical, do trabalho duro, da honestidade essencial, e das exigências da liberdade do espírito e dos livres espíritos para se sonhar e trilhar por esta dobra do mundo.?
 


Carlos Henrique Nery Costa
Presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical

Teresina, 16 de Maio de 2011?