Notícias

Fitoterápicos surgem como opção para tratamento da Aids Herbal Medicines emerge as an option for AIDS treatment

08/05/2013

Fitoterápicos

Reconhecida como método terapêutico pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) desde 1992, das 250 mil plantas medicinais catalogadas em todo o mundo, 55 mil estão em território brasileiro, o que comprova a grande biodiversidade nacional. Embora não se saiba ao certo o tamanho do mercado de fitoterápicos no Brasil – calcula-se que movimente cerca de 10% do setor de fármacos –, é consenso que seu consumo vem aumentando no País e no mundo.

Apesar de o Brasil não ter registrado, conforme consulta na Plataforma Lattes, nenhum estudo com correlação entre plantas medicinais e Aids, Dra. Paula Melo Martins, farmacêutica, especialista em processamento, produção e controle de qualidade de plantas medicinais, aromáticas e condimentares e professora da Universidade de Brasília (UnB), defende que os fitoterápicos podem ser importantes aliados para melhorar a imunidade e minimizar efeitos colaterais do coquetel de medicamentos para o tratamento da doença.

A exemplo do que já vem ocorrendo na Nigéria, conforme divulgado na Vangard, o Brasil já aposta em medicamentos à base de plantas medicinais para combater alguns agravos.

Em entrevista à Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT), Dra. Paula Martins fala sobre medicamento fitoterápico e sua possível utilização para o tratamento da Aids.

SBMT: No seu entendimento é possível que um medicamento feito à base de plantas medicinais seja eficaz no tratamento da AIDS?

PM: É importante salientar que os medicamentos fitoterápicos, feitos a partir de extratos de plantas medicinais, são importantes enquanto alternativa terapêutica para doenças relacionadas à atenção primária à saúde, como dores de cabeça, ansiedade, distúrbios gastrointestinais, doenças de pele, problemas respiratórios, entre outras. Nesse contexto, fica claro que as plantas medicinais ou seus derivados não têm efetividade na cura da Aids, entretanto, estudos demonstram que determinadas espécies melhoram a imunidade do paciente e outras são altamente eficazes contra doenças oportunistas, assim como, contra sintomas relacionados aos efeitos adversos de drogas anti-retrovirais utilizadas pelos pacientes que encontram-se em tratamento.

Os distúrbios frequentemente citados são problemas de pele, náuseas, depressão, insônia, dores no corpo e diarreias, que comprometem sobremaneira a qualidade de vida, acarretando em falta de adesão ao tratamento. Nesse sentido, os fitoterápicos e os fitomedicamentos, os quais são produzidos a partir de frações ativas de plantas medicinais, tornam-se importantes aliados terapêuticos a serem utilizados como protocolo de tratamento de pacientes portadores de HIV. Por outro lado as matrizes vegetais sempre foram fonte para pesquisa de novos fármacos.

SBMT: Uma vez comprovada a eficácia das drogas, é possível afirmar que elas seriam tão boas quanto os medicamentos alopáticos? Como assegurar isso?

PM: A comprovação da eficácia de drogas vegetais e moléculas isoladas a partir de seus extratos, passa pelos mesmos testes de segurança e eficácia que os fármacos sintéticos, os quais originam os medicamentos alopáticos. Para obtenção do registro de medicamento fitoterápico ou de fitomedicamento, dentro dos padrões requeridos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), faz-se necessário a realização de ensaios pré-clínicos, clínicos e toxicológicos, que irão garantir qualidade, efetividade da ação farmacológica e a segurança envolvida nos processos de metabolização e excreção dos princípios ativos.

Somente os medicamentos fitoterápicos produzidos a partir de plantas medicinais de uso tradicional, há mais de 20 anos, sem relatos de efeitos adversos, têm o registro isento da realização dos testes de segurança e eficácia. Da mesma forma, o órgão regulador de alimentos e medicamentos nos Estados Unidos, FDA, exige a realização dos mesmos testes, de modo que, um medicamento novo só pode ser comercializado após a comprovação de sua eficácia e segurança.

Conforme a exigência legal, num estudo realizado com 374 pacientes HIV positivos em tratamento com anti-retrovirais, o FDA liberou o registro e a comercialização do medicamento FulyzaqTM , obtido a partir de uma fração ativa do látex da espécie Croton lechlerei Muell. Arg, espécie nativa da América do Sul e Central, endêmica da floresta Amazônica.

 

SBMT: É normal a aprovação de uma agência reguladora, como é o caso do FDA nos EUA, demorar tanto tempo (desde 2006) para autorizar o uso do medicamento? Por que isso ocorre?

PM: O tempo estimado para a obtenção de um novo medicamento a partir de plantas medicinais é em média 10 anos, considerando-se as etapas de seleção etnobotânica da espécie, revisão bibliográfica, estudos botânicos, preparação dos extratos, screening fitoquímico, screening farmacológico, elucidação do mecanismo de ação, determinação das estruturas moleculares envolvidas na atividade farmacológica, estudos em tecnologia farmacêutica e finalmente os ensaios clínicos.

O critério de seleção de plantas baseado no uso popular, isto é, critério etnofarmacológico, gera um novo medicamento a cada 400 espécies selecionadas, sendo que a pesquisa aleatória de fármacos sintéticos, gera um medicamento a cada 22.900 substâncias testadas. O processo de obtenção de um novo medicamento seja ele sintético ou fitoterápico passa pelas mesmas etapas de desenvolvimento. Inicialmente com a seleção do fármaco ou planta (2 a 5 anos); estudos pré-clínicos realizados em animais (2 anos); estudos clínicos fase I realizados em indivíduos sadios (5 anos); estudos clínicos fase II realizados em indivíduos portadores da doença (3 anos); estudos clínicos fase III realizados em maior número de doentes, com acompanhamento controlado (3 anos); estudos clínicos fase IV realizados após o registro para identificação de reações adversas, interações medicamentos e segurança (1 ano).

 

SBMT: No seu entendimento pode haver uma pressão da indústria farmacêutica para que não se adotem medicamentos fitoterápicos para o tratamento da Aids? De que forma?

PM: É do interesse da indústria farmacêutica o descobrimento de novas drogas e de novos medicamentos, mesmo que a partir de plantas medicinais. Podemos citar substâncias bastante utilizadas e que tiverem sua origem em plantas medicinais e que hoje são produzidas pela indústria de forma semissintética e outras por extração vegetal.

É o caso da vincristina e vimblastina oriundas da espécie Catharanthus roseus utilizadas no tratamento de leucemia; ainda o taxol extraído de Taxus brevifolia utilizado no tratamento de câncer de mama e a pilocarpina extraída espécies de Pilocarpus utilizada no tratamento do glaucoma. De modo que, indústrias de países que detém a tecnologia de produção de medicamentos fitoterápicos e manipulação de matrizes vegetais, como é o caso da Alemanha, EUA e Canadá, a produção de fitoterápicos é sempre bem vista, principalmente em casos de pandemia como a Aids.

Por outro lado, é obrigação do poder público disponibilizar esses medicamentos a baixo custo para a população. No caso do Brasil existe ainda pouca informação científica e tecnológica sobre espécies nativas que fomente o interesse das indústrias em se adequar à produção de fitoterápicos e fitomedicamentos. Por isso, os fitoterápicos encontrados no mercado nacional têm alto custo e são produzidos por poucas indústrias.

 

SBMT: Podemos assegurar que o custo e os efeitos colaterais de medicamentos feitos à base de plantas medicinais podem ser menores do que os alopáticos? Qual a proporção? É possível estabelecer um comparativo?

PM: No caso de medicamentos fitoterápicos, a atividade farmacológica é desencadeada pela ação de diversas substâncias que atuando em conjunto leva ao efeito terapêutico. O conjunto dessas substâncias é chamado de fitocomplexo. No caso de medicamentos alopáticos, a atividade farmacológica é produzida pela ação de uma única substância ou mais, no caso de associação medicamentosa. O que se sabe pelo resultado das pesquisas é que o fitocomplexo tem menos efeito colateral, mas uma potência menor, ou seja, necessita-se de maior quantidade de matéria-prima para se atingir o mesmo efeito que no caso do fármaco sintético. Isso explica o tamanho maior das cápsulas e comprimidos à base de plantas.

Já no caso dos medicamentos alopáticos, a droga isolada é mais potente, porém com maiores efeitos colaterais e adversos. Só existe uma correlação definida entre o efeito terapêutico gerado por fármacos sintéticos e fitoterápicos, quando o extrato vegetal utilizado na produção do fitoterápico é padronizado em uma quantidade definida daquele princípio ativo ou grupo químico considerado marcador da espécie.

 

SBMT: Em sua opinião, o uso de medicamentos fitoterápicos pode vir a ser uma nova opção de tratamento da Aids no Brasil? Quais as vantagens?

PM: No meu entendimento os fitoterápicos podem ser uma excelente opção de tratamento para as doenças oportunistas que atingem os pacientes aidéticos, além de minimizarem os efeitos colaterais ocasionados pelas drogas anti-retrovirais utilizadas pelos pacientes em tratamento, aumentando assim sua qualidade de vida. Diversas pesquisas estão sendo desenvolvidas em todo o mundo na busca de um novo medicamento ou uma nova molécula para a cura da Aids.

Caso esse novo medicamento seja um fitoterápico, a exploração sustentável da espécie geraria uma nova opção de renda para produtores agrícolas e comunidades rurais, uma vez que a qualidade de um fitoterápico começa pelas boas práticas de cultivo, colheita e processamento. Outro aspecto importante na produção de fitoterápicos é o desenvolvimento tecnológico da matéria-prima para que ela seja viável industrialmente para a produção do medicamento, além da realização de todos os ensaios clínicos, caso necessário, recomendados pela legislação vigente.

Para que todas essas etapas sejam realizadas é necessária a participação das instituições de pesquisa, incentivo das agências de fomento do Brasil e adequação do nosso parque industrial. As vantagens desse processo seriam desde um menor custo do medicamento para a população, a valorização da nossa flora, o fortalecimento da pesquisa no País, além do desenvolvimento tecnológico e de inovação da indústria.

Herbal

Recognized as a therapeutic method by the Federal Council of Medicine (CFM) since 1992, of the 250,000 medicinal plants cataloged worldwide, 55,000 are found in Brazilian territory, proof of Brazil’s great national biodiversity. Although no one knows for sure the size of the market for herbal medicines in Brazil – it is estimated to account for about 10% of the pharmaceutical industry -, there is a consensus that consumption of herbal medicines is increasing in the country and the world.

Although Brazil has not registered, according to a search of the Lattes Platform, any study that correlates medicinal plants with AIDS treatments, Dr. Paula Melo Martins, a pharmacist and specialist in processing, production and quality control of medicinal and aromatic plants and spices and teacher at the University of Brasilia (UnB), argues that herbal remedies can be important allies to improve immunity and minimize the side effects of the cocktail of drugs used to treat the disease.

Following the example of Nigeria, as reported in Vangard, Brazil is already betting on medicines based on medicinal plants to combat some illnesses.

In an interview with the Brazilian Society of Tropical Medicine (SBMT), Dr. Paula Martins talks about herbal medicine and its possible use in the treatment of AIDS.
 

SBMT: In your understanding is it possible that a drug made from herbal medicine can be effective in the treatment of AIDS?

 
PM: It is important to stress that herbal medicines, made from herbal extracts, are an important alternative therapy for diseases related to primary health care, such as headaches, anxiety, gastrointestinal disorders, skin diseases, respiratory problems, among others. In this context, it is clear that medicinal plants or their derivatives are not effective in curing AIDS; however, studies have shown that certain species improve the immunity of the patient and others are highly effective against opportunistic diseases, as well as against symptoms related to the adverse effects of antiretroviral drugs used by AIDS patients. 

Disorders frequently cited are problems of the skin, nausea, depression, insomnia, body aches and diarrhea, which greatly compromise quality of life, resulting in lack of adherence to treatment. In this sense, herbal therapies and medicines, which are produced from active fractions of medicinal plants, are important allies to be used as a therapeutic treatment protocol for patients with HIV. Moreover, plant matrices have always been a source for researching new drugs.

 
 

SBMT: Once the effectiveness of drugs is proven, is it possible to state that they are as good as allopathic medicines? How can one ensure this?

PM: The proof of the efficacy of herbal drugs and molecules isolated from their extracts, passes the same safety and efficacy testing as synthetic drugs, which are the basis of allopathic medicines. For a herbal medicine or phytomedicine to be registered, it must meet the standards required by the National Agency for Sanitary Surveillance (ANVISA) and be submitted to pre-clinical, clinical and toxicological tests, which ensure quality, effectiveness of pharmacological action and safety involved in the processes of metabolism and excretion of the active ingredients. 

Only herbal medicines made from medicinal plants traditionally used for over 20 years, and with no reports of adverse effects, are exempt from the tests of safety and efficacy. Likewise, the food and drugs regulator in the United States, the FDA, requires the completion of these tests, so that a new drug can only be marketed after proving its efficacy and safety. 

In line with legal requirements, in a study of 374 HIV-positive patients treated with antiretroviral drugs, the FDA allowed the registration and marketing of the product FulyzaqTM, obtained from an active fraction of latex of the Croton lechlerei Muell. Arg species, which is native to Central and South America, and endemic to the Amazon rainforest.

 
 

SBMT: Is it normal for the approval of a regulatory agency, such as the FDA in the United States, to take so long (since 2006) to authorize the use of a drug? Why is that?

PM: The estimated time to obtain a new drug from medicinal plants is on average 10 years, taking into account the stages of ethnobotanical selection of the species, literature review, botanical studies, preparation of extracts, phytochemical screening, pharmacological screening, elucidation of the mechanism of action, determination of the molecular structures involved in the pharmacological activity, studies in pharmaceutical technology and eventually clinical trials.

The criterion for selection of plants based on popular usage, i.e., ethnopharmacological criterion, generates a new drug for every 400 species selected, and the random survey of synthetic drugs, generates a medication for every 22,900 substances tested. The process of obtaining a new drug, whether it is synthetic or herbal, involves the same stages of development: selection of the drug or plant (2-5 years); pre-clinical studies in animals (2 years); Phase I clinical studies conducted in healthy subjects (5 years); Phase II clinical studies conducted in patients with the disease (3 years); Phase III clinical trials conducted in more patients with controlled monitoring (3 years); Phase IV clinical studies conducted after registration for identifying adverse reactions, drug interactions and safety (1 year).

 
 

SBMT: In your view is there pressure from the pharmaceutical industry to not adopt herbal medicines for the treatment of AIDS? In what way?

PM: It is in the interest of the pharmaceutical industry to discover new drugs, even ones from medicinal plants. There are widely used substances that have their origin in medicinal plants and that are currently produced by the industry in a semi-synthetic form and others through plant extraction.

This is the case with vincristine and vinblastine, which are derived from the species Catharanthus roseus, and used in the treatment of leukemia; also taxol, extracted from Taxus brevifolia, is used to treat breast cancer; and pilocarpine, extracted from the species Pilocarpus, is used in the treatment of glaucoma. So, in countries with the technology to produce herbal medicines and manipulate vegetable matrices, such as Germany, the USA and Canada, the production of herbal medicines is always well regarded, especially in pandemic cases such as AIDS. 

On the other hand, it is the government’s obligation to provide these drugs at low cost to the population. In Brazil there is still hardly any scientific and technological information on native species to promote the industrial production of herbal and phyto medicines. Therefore, herbal remedies in Brazil are expensive and are produced by only a few industries.

 
 

SBMT: Can we ensure that the cost and side effects of medicines based on medicinal plants are lower than with allopathics? What is the proportion? Is it possible to establish a comparison?

 
PM: In the case of herbal medicines, the pharmacological activity is triggered by the action of several substances acting together to create the therapeutic effect. The combination of these substances is called a phytocomplex. In the case of allopathic medicines, the pharmacological activity is produced by the action of a single substance (or more in the case of combination therapy). What we know from the result of research is that the phytocomplex has less side effects, but a lower power: it requires a greater amount of raw materials to achieve the same effect as a synthetic drug. This accounts for the larger size of herbal capsules and tablets. 

In the case of allopathic medicines, the isolated drug is more powerful, but with greater adverse side effects. There is only one definite correlation between the therapeutic effect generated by synthetic drugs and herbal remedies: when the plant extract used in the production of herbal medicine is standardized at a set amount of that active ingredient or chemical group considered a marker of the species.

SBMT: In your opinion, can the use of herbal medicines be a new option for the treatment of AIDS in Brazil? What are the advantages?

 
PM: In my understanding, herbal remedies can be an excellent option for treating opportunistic infections affecting AIDS patients, in addition to minimizing the side effects caused by antiretroviral drugs used by patients in treatment, thereby improving their quality of life. Several studies are being undertaken around the world in search of a new drug or a new molecule to cure AIDS.

If this new medicinal product is an herbal medicine, the sustainable exploitation of the species would generate a new option of income for farmers and rural communities, since the quality of a herbal medicine starts with good farming, harvesting and processing practices. Another important aspect in the production of herbal medicines is the technological development of the raw material so that it is industrially feasible to produce the drug, in addition to carrying out all clinical trials, if necessary, recommended by current laws.

If all these steps are to take place, there must be participation of research institutions, encouragement of development agencies in Brazil and the provision of suitable industrial parks. The advantages of this process would be a lower cost of the drug to the population, value given to our flora, the strengthening of research in the country, as well as technological development and industrial innovation.